segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Místico

Lembro-me bem das mãos quentes da mulher afetuosa. Ela tinha um sorriso contagiante. Era só a minha mãe dizer que era dia de benzer que eu e meus irmãos ficávamos felizes. Chegávamos a uma casa modesta onde a mulher nos recebia passando as mãos em nossa cabeça antes de colocar-nos numa sala enfeitada. Lembro-me de suas mãos quentes me tocando antes de serem elevadas ao ar. A mulher, cujo nome não me lembro mais, começava uma pantomima engraçada; ela começava a girar os braços e a fazer um sussurro estranho com a boca. Passavam apenas alguns segundos e uma sensação de paz tão profunda invadia-me a alma que simplesmente me entregava ao sono profundo. Minha mãe me acordava rindo com a mulher. Depois, quando era a vez dos meus irmãos, ficava tentando a ver como funcionava a tal reza, mas a mulher tinha olhos na nuca e me via a espiar por debaixo da cortina. Ela ficava um pouco brava e me mandava ir lá à frente da casa com a minha mãe. Mas era a mesma coisa que fazia comigo. Meus irmãos fechavam os olhos e dormiam também. Lembro-me do quarto colorido, de uma vela branca em cima da mesinha de centro, e uma imagem pendurada na parede. Sua casa era revestida por uns azulejos cujos desenhos eram umas estrelinhas ao centro. Azulejos que até hoje quando vejo iguais lembro-me da mulher afetuosa. Tive outras religiões no decorrer dos anos, mas nunca me esqueci daquela mulher que recusava o dinheiro que a minha mãe oferecia. “Faço por amor”. É o que ela dizia. Às vezes quando tenho um indicio de pesadelo, lá no fundo das trevas escuto a voz daquela mulher voltando com uma força inexplicável. Logo sou embalado na mesma paz que é o preâmbulo do sono profundo! Ives vietro

8 comentários:

  1. Uma experiência mística de anjos e espíritos que se complementam... Não tenho dúvida alguma! Fazia parte da nossa terapia infantil!
    Abraço.

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  2. Olá, Ives, como vai?
    Também eu era levada à benzedeira quando criança, lembro-me da casa muito simples, do cheiro de ervas que aspergiam água e da reza baixinha e rápida... são pessoas de muita força espiritual, né? E que bom que até hoje essa força o acompanha em suas memórias profundas trazendo paz! Abraços!

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  3. IVES: Bom dia! Belos escritos.Aprecio muito o lado místico. Creio que exista. Vc fala sobre o assunto de um jeito romântico e sensível! Acho que esta rezadeira era meio anjo! Já frequentei esse tipo de coisa...rsss, mas hoje não vejo mais. Porém, esta mulher que vc descreve com tanta doçura, é um verdadeiro anjo, pois não aceitava nenhum centavo! é muito difícil esse pessoal fazer a coisa apenas por amor. Ela é bendita! Agradável vir aqui no seu espaço e se deliciar com os seus posters. Abraços e uma boa semana.

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  4. Meu amigo poeta Ives, que lindo ler aqui, misticamente lindo, a paz, a sensação de paz que muitas pessoas podem nos passar, e quem nunca foi a uma benzedeira? Acredito que todo mundo já teve essa linda e pacífica experiência que nos mostra aqui com leveza!
    Abraços apertados!

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  5. Histórias de outros tempos em que as mães acreditavam que havia mãos que curavam...
    Uma boa semana.
    Beijos.

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  6. Determinadas pessoas nos transmitem paz, e isso é definitivamente impagável.

    Beijão!
    Blog: *** Caos ***

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  7. Eu não entendo como esses homens podem encostar a cabeça no travesseiro e dormir, como conseguem fazer tanto mal para seu povo e não entendo como depois de tanta corrupção ainda estão no poder fazendo o que bem entende...lamentável...Feliz natal e uma bela entrada de ano com esperança...

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  8. Gostei imenso de ler esta partilha, pelo conteúdo e pela forma de narrar. Estas crendices, como por cá se diz, eram apaziguadoras.
    Bj, Ives

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