segunda-feira, 7 de julho de 2014

Sétima e ultima parte de Galo?

Uma gota de chuva teimosa deslizada pela janela de Maria, desenhava em seu interior as imagens do futuro. O campo se tornava extraordinariamente poético nos dias de chuva. O colete azul de lã que usava aquecia a sua pele, mas o seu coração ainda solitário ansiava por flores. O sonho é a continuação do projeto na Terra. As ondas que vão e vem e tocam na sinuosidade das formas concretas. As mãos da mãe, depois as dela, depois as dos filhos, netos...! A prole deveria ser da cor daquele dia dourado, e só baseado em aromas delicados ao amor cresceria. No horizonte um céu pincelado pelos anjos desbotava as matizes irisados, logo o sol romperia a chuva. Era sábado, dia do baile na fazenda. Em seu foro íntimo lembrava com carinho da palavra do pai, que favorecia exatamente aquela que ela menos se inclinava. Apesar de o feitor ser de traços brutos era de família abastada, parente do fazendeiro. A muitos o dinheiro e a fortuna são sinônimos de riqueza, e a prole, mesmo virtuosa, não tem sentido na cabeça dos mais materialistas, porém foi e sempre será, a luz que abre os poros da verdade. Maria fora criada para ser mãe. “Menina prendada, como diziam”. Herdou da terra a mesma flor que germinava em seu coração. A tendência para o amor em sua razão pulula aparentemente de forma mística, contudo são as válvulas de outras vidas que deixam escoarem no pensamento a admiração pelo firmamento. O sol fazia sua parte, acordava os mais adormecidos, enraizava-se na mantilha das peles ilusórias, crescia o calor que expande o universo todo, dentro de um olhar de admiração na terra de chão iluminado. Foi cantando que Maria preparou um suculento e reforçado almoço para o pai, ele que sempre a acompanhava ao baile, não podia ficar muito cansado, pois dependia de sua energia a ficar até a madrugada dançando e se divertindo.
Do outro lado da fazenda, Ives preparava sua roupa, que nesta noite, depois de tanto chorar por não participar do baile, poderia desfilar o terno de listras que comprara de um judeu que visitava a fazenda uma vez por mês. Tomou banho, e passou também um perfume almiscarado, raro nesses tempos de dinheiro escasso. Lavou o alazão, lustrou-lhe os pelos, e quando o montou parecia de fato um grande cavalheiro. Se não fosse pela fome que assolava o seu estomago estaria realmente perfeito, mas preferiu comprar o que o fazendeiro, de modo oculto, impingira nos seus desejos! Antes de ir ao baile, Ives tomou um generoso gole de pinga do barril do irmão, e saiu em disparada. À distância ouvia o som da sanfona que anima, e agitava de modas sertanejas, o grandioso evento de sábado. Um sorriso prateado adornou seu rosto quando avistou a conhecida charrete da família de Maria. “Hoje eu conquisto aquele valoroso coração”.  A tenda de lona armada não era das maiores, nem das melhore, mas em terra seca a orquídea é o capim. Todos ficaram estáticos quando viram o galante cavalheiro adentrando ao recinto. Apenas Maria conseguia distinguir sua espádua. Ela que dançava com o feitor, não pode deixar de notar nos olhos do “menino” certo ar de melancolia. Ives sabia que não podia interromper a dança, e que deveria esperar a sanfona reinicia para ousar chegar até Maria. Antes deveria cumprimentar o pai e pedir a benção. Este assentindo disse que poderiam dançar, porém a mão de Maria poderia ter dono já. Ives não se deixou abater e compro a prenda mais cara do baile, uma flor de cinco mil reias. Gastara todas as suas economias com o foco no amor, no pujante amor. Maria mal se sentou ao lado do pai e o menino guerreiro estava ao seu lado oferecendo suas cordiais mãos para uma dança. Ela sorriu prateado também. O doce aroma contagiou de sortilégios o espírito de Maria, que deslumbrava no amor um futuro seguro. Dançaram apenas uma música, e os dois se separaram por um súbito silêncio. Ives caiu no chão e o sangue escoado na terra dera à cena a devida realidade. Ives acabava de ser assassinado?




3 comentários:

  1. Surpreendente ! uma simples dança, um simples sinal de possibilidade seria um fim fatal para um sonho de amor? Dói o coração se assim for , como uma flor pisada por um coração insensível. Nas mãos do Criador salvar a criatura, para que a vida possa ter sentido.
    Um abraaço

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  2. Nossa, que revés à tragédia! Talvez o sangue fosse de Maria? Abraço Ives.

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  3. Sensacional,Ives! És demais mesmo!Adorei! abração,chica

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